Ao longo da vida todos nós vamos repetindo determinados comportamentos que cumprem objetivos traçados por nós, estejamos cientes ou não desse processo. Ao conjunto de comportamentos que temos e que ativamos de forma automática, sem a necessidade de pensar de forma elaborada, chamamos de hábitos. Ao longo desse processo as nossas ações são guiadas pela necessidade de obtermos recompensas/reforço ou evitarmos punições/mal-estar.
A forma de obtermos reforço positivo dos nossos comportamentos ou evitarmos a punição (reforço negativo) nem sempre nos conduz a hábitos saudáveis. E, também podemos considerar o nosso padrão de pensamento como um hábito. Se vamos instituindo uma forma depreciativa de pensar acerca de nós, podemos dizer que implementámos pela força da repetição um padrão negativo de pensamento, ao que podemos chamar um mau hábito de pensar negativamente acerca de nós mesmos. O que suporta esse pensamento negativo acerca de nós mesmos é o nosso diálogo interno autocrítico.
Diálogo interno autocrítico uma via para os maus hábitos
Na grande maioria da vezes este diálogo interno autocrítico começa a dar os seus primeiros passos em tenra idade. Sim, algumas crianças têm pensamentos depreciativos acerca delas mesmas, talvez mais do que possamos imaginar. Apesar de que todos nós gostaríamos de pensar a infância como um tempo em que estamos alegremente livres de autoconsciência e autodepreciação, na grande maioria das vezes isso não é o que se verifica. Pergunte a qualquer criança se ele ou ela tem maus pensamentos sobre si mesmo e, eu garanto, você vai ficar chocado ao ouvir a resposta.
“Eu sou tão feio, o meu cabelo me faz feio. É tão espetado e grande.”
“Eu estou com medo que eu não consiga acertar as respostas no teste da escola. Eu não sou bom o suficiente. Eu não sou tão inteligente como as outras crianças.”
Certamente é muito perturbador ouvir os nossos filhos proferirem tais declarações cruéis para com eles mesmos. Não podemos deixar de refletir em algumas razões que podem conduzir a esse tipo de autoapreciação negativa. Provavelmente ouvem de nós adultos algumas palavras que os depreciam, assim como também aprenderam o exemplo dos adultos a autodepreciarem-se. É um duplo ensinamento negativo que conduz a criança a um padrão negativo de pensamento acerca de si mesmo, que depois se propaga até à idade adulta.
É doloroso reconhecer como podemos estar alheios à nossa própria atitude autocrítica. E o nosso diálogo interno autocrítico pode ser especialmente cruel quando se trata de estabelecemos metas para nós mesmos, hábitos que queremos quebrar, ou formas de comportamento que queremos mudar.
A autodepreciação é um diminuidor comum, afeta negativamente toda a estrutura do nosso ser. Todos os conceitos que temos acerca de nós e das nossas capacidades e habilidades sofrem um impacto negativo. A autoconfiança, autoestima, resiliência, noção de autoeficácia entram numa espiral negativa descendente, conduzindo-nos a um pântano viscoso. A nossa mobilidade mental fica reduzida, julgamos realmente que estamos incapacitados e vitimizamo-nos.
A Autoconfiança é o combustível para o Sucesso. O sucesso está fortemente relacionado com a capacidade que se tem para dirigir os pensamentos para o que pode aumentar as probabilidades de eficácia. O que dirige os pensamentos somos nós mesmos através do nosso diálogo interno.
Maus hábitos como recompensa ou evitamento de incómodo
Alguns de nós numa tentativa de ultrapassar o incómodo de alguns pensamentos e sentimentos negativos acerca de nós mesmos, enveredamos por comportamentos pouco saudáveis, e por vezes até destrutivos. Vamos pouco a pouco nesses comportamentos indesejáveis procurar algum alívio e refúgio para o nosso estado de ser deprimido e diminuído. É um escape, é uma tentativa de buscar conforto e reforço ou evitar a exposição e a não aceitação ou vergonha. É uma substituição da recompensa que não se consegue obter através do reconhecimento de valor próprio.
Estes comportamentos desviantes ou maus hábitos podem ir de pequenos incómodos, como por exemplo impulso para compras, fumar, comer em excesso, descuido com a imagem, mentiras, levantar tarde, adiar o trabalho, respostas impulsivas, chantagem emocional, arrogância, evitamento social ou comportamentos destrutivos como o vício pernicioso do álcool, jogo, sexo, drogas, entre outros.
Quando um mau hábito evolui e se torna num vício, tudo se torna mais difícil. A voz interna passou a ser uma intrincada teia de desculpas, de movimentos para o lado, de recuos, de subterfúgios em que o objetivo máximo passa a ser alimentar o vício. A pessoa engana-se e engana no sentido de alinhar os seus comportamentos ao serviço do vício. Evidentemente que existem vícios altamente destrutivos e outros que apenas nos causam incómodos e dificuldades na vida. Uns destroem, outros impõem-se como um obstáculo ao bom desenvolvimento da vida.
No entanto, na sua base está um diálogo interno autocrítico, que foi evoluindo, afastando a pessoa dos comportamentos adequados à obtenção de alguns dos seus objetivos. Para aprofundar o assunto, leia: Como superar um vício?
Refletir sobre os maus hábitos
Se você se encontra num momento da sua vida em que a sua negatividade tem vindo a aumentar, é importante que possa tomar algum do seu tempo para refletir sobre o assunto. Pondere algumas das razões que possam estar na base da criação do seu padrão negativo de pensamento e consequentemente na implementação de alguns dos seus maus hábitos. Ao fazer isso, abraça a oportunidade de se diferenciar e desapegar de influências negativas do seu próprio passado e da sua infância e viver livre de limitações ilusórias.
Você tem em si mesmo a capacidade para liderar-se e mudar os seus maus hábitos. Sejam hábitos comportamentais ou hábitos mentais. Você pode abandonar os seus comportamentos indesejados e implementar o pensamento positivo na sua vida.
PASSO 1: IDENTIFICAR O DIÁLOGO INTERNO AUTOCRÍTICO
No artigo, 7 Maneiras de identificar o seu diálogo autocrítico, apresentei sete características comuns que podemos ter quando accionamos o diálogo interno autocrítico irracional. Esse discurso silencioso que vamos tendo é geralmente percecionado como um processo de pensamento que impiedosamente nos coloca para baixo e sabota os nossos resultados. Por exemplo, uma pessoa que está tentando perder peso pode ouvir ataques como: “Você é tão gordo. Você nunca vai perder peso. Você deve simplesmente desistir.” Uma pessoa que tenta construir a coragem de pedir a alguém para sair num encontro a dois, pode ouvir vozes, como: “Você é um perdedor Ele/Ela nunca sairia com você. Você irá apenas envergonhar-se. “
O diálogo interno autocrítico irracional é bastante prevalente na vida das pessoas. A maioria das pessoas que eu tenho vindo a ter em consulta tradicional ou nas consultas de psicologia online, quando familiarizadas com o conceito da voz interior foram capazes de identificar o quanto interfere com algumas áreas específicas das suas vidas.
A fim de superar alguns dos maus hábitos (comportamentais e mentais), é essencial que você identifique a sua voz autocrítica que os suporta e alimenta:
- Em que situações é que surgem as vozes?
- Que ações alimentam essas vozes?
- O que a sua voz diz sobre você mesmo?
- Sobre os seus relacionamentos?
- Sobre os seus filhos?
- Sobre o seu trabalho?
Será que a sua voz silenciosa autocrítica apresenta um tom irritado, atacando-o diretamente? Como por exemplo: “Você não é como as outras pessoas. Você não é atraente. Você é estúpido. Ninguém nunca vai realmente importar-se com você.”
Ou ao invés a sua voz é suave e autocalmante, enviando-lhe mensagens enganadoras: “Não se preocupe, você está bem sozinho. Veja? Você não precisa ajuda de ninguém. Pegue esse segundo pedaço de bolo, você merece. Mais uma bebida vai fazer você sentir-se muito melhor.”
A voz pode ser brutal e óbvia, mas também pode ser enganadora e difícil de reconhecer, como incitando-o a agir contra os seus objetivos. Mas quando você segue essa voz (a voz criada por si mesmo de forma subconsciente), então, você pune as suas próprias ações que a sua voz silenciosa o incentivou a fazer. É paradoxalmente destruidor. Você desenvolveu uma voz que o incentiva a não fazer determinadas coisas, ou que julga não ser capaz, e depois ao seguir essa indicação essa mesma voz deprecia-o, deitando-o ainda mais abaixo, confirmando as suas suspeitas de incapacidade.
Ou ao invés, essa voz pode conduzi-lo para comportamentos desajustados e prejudiciais, que o afastam do seu objetivo, e que posteriormente o critica por ter feito o que não devia. Essa voz é uma faca de dois gumes, em que os dois gumes são cortantes. E em que os dois gumes são você mesmo. Uma vez a voz cortante, outra vez o “alvo” dessa mesma voz.
Pense sobre as situações que fazem disparar a sua voz crítica:
- Quais são as coisas específicas que essa voz diz nesses momentos?
- Que resultado negativo é que esses pensamentos parecem desejar?
- Essa voz está de acordo com aquilo que você quer e pretende alcançar?
Quando você identifica essa voz, é útil anotar as indicações sugeridas por ela. Escreva-as na primeira pessoa, como “Eu”. Por exemplo, você pode ter pensamentos como: “Eu nunca vou conseguir essa promoção. Ele/ela vai-me deixar. Eu sou uma péssima mãe/pai.”
Depois, tente perceber que tipo de distorção do pensamento pode estar associado à negatividade dessas declarações. Para ter acesso às distorções do pensamento mais comuns, leia: Distorções do pensamento, saiba porque causam problemas e como as mudar. Este exercício vai ajudá-lo a entender o verdadeiro impacto negativo da sua voz interna crítica. É como um inimigo sádico, e você pode parar esses ataques com afirmações verdadeiras sobre quem você realmente é.
PASSO 2: REDIRECIONAR O DIÁLOGO INTERNO AUTOCRÍTICO
Depois de identificar a sua voz interior crítica , você ficará numa posição mais favorável para redirecioná-la de forma positiva e construtiva. Ao descobrir que distorções do pensamento podem estar a promover a sua voz interior crítica, certamente irá construir um novo ponto de vista, agora mais realista e compassivo. O que se pretende é que você consiga reestruturar o pensamento para pensamentos mais capacitadores.
Por exemplo, você pode responder às afirmações acima exemplificadas, escrevendo coisas como: “Eu posso cometer erros de vez em quando, mas estou trabalhando duro e fazendo um bom trabalho. Eu não sou perfeito, mas eu preocupo-me com o meu relacionamento, e eu posso fazer melhor. Eu tenho um monte de qualidades positivas, como mãe/pai, e eu posso trabalhar para mudar em mim alguns comportamento que eu não gosto.”
A intenção deste exercício não é para passar a ser uma outra pessoa ou para aumentar o seu ego. Em vez disso, pretende-se que você adote uma atitude mais realista e que isso permita separá-lo das atitudes e pensamentos distorcidos que o seu diálogo interior autocrítico teima em emitir. Expliquei este assunto de forma mais aprofundada no artigo: Capacite-se e desafie o seu diálogo interno autocrítico.
A forma mais poderosa para combater a sua voz interior crítica é com as suas ações. Sendo que na grande maioria das vezes o seu diálogo interno crítico restringe o seu campo de ação, faz com que você evite aquilo que supostamente julga não ser capaz de realizar. A forma de ultrapassar essa paralisia provocado por alguns dos seus medos ilusórios é passar à ação. E a forma de passar à ação é através de um redirecionamento dos seus pensamentos negativos para pensamento positivos. Para pensamentos capacitadores que orientem as ações em direção aos seus objetivos pretendidos.
Depois de reorientar o seu diálogo interno, desta vez, com palavras de apreciação e de suporte a você mesmo, avance para as ações correspondentes. Por cada vez que conseguir detetar o seu diálogo interno crítico e correspondentes distorções do pensamento, e reorientar tudo isso para um diálogo construtivo, o seu velho hábito mental autodepreciativo vai perdendo a força. E, consequentemente o novo hábito, mais positivo, otimista, assertivo e realista vai ganhando o seu lugar.
Dica: A técnica eficaz é não dar “ouvidos” ao seu diálogo interno autocrítico e ao mesmo tempo criar um novo guião de afirmações, ideias e pensamentos mais construtivos, capacitadores e alinhados com os novos hábitos saudáveis que pretende implementar.
Abraço,
Miguel Lucas
Excelente artigo !
gostei do comenterio,com certeza vai me ajudar a vencer ,estou a muito tempo procurando força ,e tudo relacionado aos problemas internos me interesam , parabens miguel obg.
Olá. Miguel!
Leio sempre os seus artigos. E em especial neste você está de parabéns.
Muito obrigada, por me ajudar a vencer os meus medos.
Olá Miguel,
tenho seguido este blog nos últimos tempos e sou apenas mais um a dar-lhe os parabéns pelo seu trabalho, está a ajudar-me também.
Quero perguntar-lhe se é saudável obter ímpeto e força de vontade para mudar através de um sentimento de raiva e revolta com a nossa situação actual. Ou seja, incentivar a mudança vingando-nos de nós próprios.
Por sermos responsáveis pela nossa situação actual, que pessoalmente não é a melhor, é bom ir buscar forças para mudar para melhor nestes sentimentos negativos?
Isto porque penso que o meu problema reside na falta de força de vontade para mudar, tenho motivos para querer mudar mas não consigo canalizar forças para agir. Qual a melhor solução?
Um abraço!
Olá João.
Não quero responder pelo Dr. Miguel, mas darei aqui a minha opinião por julgar que pode ser proveitosa caso não obtenha resposta tão depressa quanto pretende.
Ao recorrer a sentimentos de raiva e revolta contra si, está, na verdade, a reforçar o seu hábito da autocrítica. A descobertas mais recentes nos campos da Psicologia e Neurociência indicam que a forma com pensamos tem implicações na estrutura do cérebro, ou seja, pensarmos de forma diferente irá alterar fisicamente certas áreas do cérebro, pensar de forma igual e repetida irá reforçá-las. Não deve, portanto, incorrer neste erro, que não é mais que uma voz interna de carácter manipulador, ainda que subtilmente disfarçado, que o irá levar uma vez mais às auto-criticas diretas. Além disto, sempre que estabelecer um objectivo saudável, como ir dar uma caminha, se o falhar, o que no início é comum, a sua autocrítica será ainda mais severa, e aí sim, estará a vingar-se de si próprio, perdendo cada vez mais a força e o ânimo de recuperar.
Por experiência própria, posso dizes que a motivação é de facto essencial, infelizmente, por vez, a vontade de mudar não é suficiente, porque os medos ou a força dos hábitos têm já proporções avassaladoras. Contudo, essa motivação virá, e você saberá reconhecer esse momento. Até lá, é importante que não desista de tentar melhorar, são sobretudo as quedas e o levantar de novo que lhe darão o crescimento pessoal necessário no sentido de reconhecer essa mudança como algo positivo e possível.
Mais importante que autocriticar-se é começar a autoelogiar-se. No início parecerá aborrecido, inútil e non-sense, contudo, no médio/longo prazo, passarão a ser esses os seus pensamentos automáticos. Continue a ler artigos deste site, visto ter muita informação relativa a isso (pensamento positivo).
Abraço
Peço desculpa pelos erros ortográficos, contudo julgo que a informação está compreensível.
Olá Guilherme,
obrigado pela opinião, não tinha pensado nesse ponto da auto-crítica.
Porém, penso que o auto-elogio também pode ser prejudicial, quando em demasia, porque incentiva o orgulho-próprio e o narcisismo, não acha?
Em pessoas algo orgulhosas, como me considero, pode significar o engrandecimento em demasia, o colocar-se num pedestal por se alcançarem feitos, sejam eles pequenos ou maiores.
Um abraço
É uma boa questão.
De qualquer das formas, julgo que nem todo o orgulho é prejudicial ou amoral. Se eu tiver orgulho em mim no sentido de afirmar "sou capaz de fazer isto, e já o fiz bem várias vezes", julgo ser positivo, se for algo do género "sou melhor que os outros a fazer isto" é negativo. Aquando da depressão tinha também um orgulho muito grande, no sentido negativo (que esporadicamente ainda tenta a sua sorte), e é algo que se verifica em muitas pessoas deprimidas ou com elevada ansiedade.
Geralmente (não em todos os casos) resulta de pensamentos perfeccionistas, em que, ao nos comparar-mos com aqueles que julgamos ser melhores que nós, sentimo-nos feridos, entrando num paradoxo em que aumentamos ainda mais o nosso orgulho negativo, ou seja, valorizamos ainda mais os pensamentos em que nos tentamos superiorizar aos outros, o que acaba por não resultar e criar frustração. É essa frustração que nos dá, depois, a sensação do orgulho como vilão (em que neste caso, de facto, o é, por ser negativo).
O auto elogio, bem feito, aumentará o orgulho positivo. Da mesma forma que autoelogiarmo-nos em relação a experiências que não nos tenham corrido tão bem quanto planeávamos, mas ainda assim, bem, poderá criar em nós um pouco mais de humildade (isto parece falacioso, e por isso tentamos evitar estes elogios simples. Elogiamo-nos apenas naquilo em que nos julgamos melhores. Isto sim é exemplo da sociedade competitiva em que vivemos, e contrário ao valor da humildade)
Guilherme por gentileza qual o seu contato? Posso escrever pra Vc? Obrigada
Parabéns pelo blog. Tem muito tempo que procuro um treinamento pisicológico de qualidade.
Estou divulgando para amigos e no facebook. Obrigado.
Obrigado,você está ajudando muito no crescimento pessoal não só meu, mas contribuir em um todo familiar…
60 mil pensamentos por dia. só morando no meio do mato.
Muito bom o artigo.
Eu adorei o artigo,inclusive eu me identifiquei com alguns maus hábitos.Eu tenho pensamentos negativos sobre mim,e por causa disso me isolei por muito tempo,evoluir medo de tudo,perdir a vontade de viver.Aos poucos estou retornando a minha vida e tentando amenizar o tempo que perdir.Mais ainda é um pouco difícil,pois já tinha até esquecido como andar no meio da multidão sem me sentir um nada
Graças a Deus