Às vezes, todos nós temos preocupações. Ocasionalmente, por uma boa razão. Mas a preocupação também pode ficar fora do nosso controle, ao ponto de perder o seu valor, tornando-se excessiva e consequentemente prejudicial. A preocupação e a ansiedade estão intimamente relacionadas. A ansiedade pode manifestar-se de muitas maneiras, incluindo preocupação excessiva e persistente.
Por exemplo, no Transtorno de Ansiedade Generalizada, a ansiedade excessiva e preocupação (expectativa apreensiva) sobre eventos tais como o desempenho na escola ou no trabalho esteve presente a grande maioria dos dias por um período de pelo menos seis meses. Por definição, esta contínua preocupação é de difícil controle e causa sofrimento clinicamente significativo e/ou prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou outras atividades diárias.
Ironicamente, a preocupação que normalmente é uma tentativa de antecipar e impedir que coisas ruins aconteçam, tende a fazer com que a pessoa fique ainda mais ansiosa, criando um interminável e constante crescente ciclo vicioso de preocupação e ansiedade (mais preocupações, mais ansiedade). Porque nos preocupamos tanto? O que é exatamente isso de ficarmos preocupados? E como podemos preocupar-nos um pouco menos?
Temenos o futuro
Primeiro e acima de tudo, tememos o futuro. O desconhecido. A capacidade extraordinária que o nosso lobo frontal tem, permite que nos preocupemos com o que vai acontecer-nos, à nossa família, nosso parceiro, nosso negócio, nosso dinheiro, nossa casa, nossas posses, nosso país, no mundo, etc.
Nós vivemos num universo que é inerentemente imprevisível e por vezes perigoso. Quando nos sentimos ameaçados direta ou indiretamente dispara em nós um sinal de alarme que é sentido através dos sintomas da ansiedade, esta ansiedade sentida faz disparar a preocupação que induz a pensarmos numa forma de restabelecermos o equilíbrio, eliminar ou lidar com a ameaça.
A preocupação é sentida no presente e tem sempre um pé no futuro, é direcionada a algo que pode estar a acontecer ou que irá acontecer.
A ansiedade é sentida no nosso corpo através de sintomas físicos, como o batimento cardíaco acelerado, sudação, nó na garganta, borboletas no estômago, tensão muscular, entre outros.
A ansiedade também tem uma manifestação na nossa mente, chama-se ansiedade cognitiva, que é uma forma de preocupação. São um conjunto de pensamentos que temos acerca da identificação da possível ameaça no ambiente e ainda a avaliação acerca do que sentimos no nosso corpo.
A ameaça no ambiente nem sempre é uma ameaça direta como se alguém nos apontasse uma arma, podemos igualmente sentirmo-nos ameaçados pela possibilidade de perdermos o emprego, não passar num exame, terminar um relacionamento ou estarmos à beira de perder a nossa casa. Em qualquer das situações, temos a noção da nossa preocupação devido à capacidade que temos para monitorizar a ameaça.
Preocupação normal e patológica
Quando a nossa preocupação e monitorização da ameaça fica única e exclusivamente centrada em nós mesmos, naquilo que sentimos no corpo e naquilo que nos passa na mente, na forma de pensamentos acerca do medo que temos do que estamos a sentir (sensações físicas) ser ruim, prejudicar a saúde, ficarmos loucos ou levar à morte, desenvolvemos ansiedade e preocupação patológica.
Este cenário usualmente está relacionado com a experiência de ataques de pânico. Desenvolve-se quando começamos a ter medo de vir a sentir medo. Preocupamo-nos sobre a possibilidade de nos preocuparmos. E que os pensamentos que dão conteúdo à preocupação podem ser prejudicais.
A ansiedade e a preocupação são reações normais, por vezes úteis e bem-vindas. No entanto ficarmos exageradamente preocupados sobre a nossa ansiedade e preocupação, pode originar um ciclo vicioso que nos causa enorme transtorno e nos rouba a paz de espírito.
A saber: Quando nos recusamos a aceitar e tolerar a ansiedade como uma parte inevitável da nossa existência, paradoxalmente promovemos o aparecimento da ansiedade patológica e preocupações excessivas.
Algumas preocupações com o futuro podem ser inevitáveis, e, em certas situações, necessárias e potencialmente úteis. A ansiedade permite-nos antecipar (identificar) o perigo, detectar e lidar com as ameaças fundamentais para a nossa sobrevivência básica, para motivar e energizar-nos, para nos avisar quando não estamos a comportar-nos de acordo com os nossos objetivos ou traímos os nossos valores básicos, para crescer com maior consciência e tornarmo-nos mais criativos.
Mas, quando tentamos evitar ou reprimir essa ansiedade saudável por negar a realidade e os nossos verdadeiros sentimentos, transforma-se em algo tóxico, tomando a forma neurótica de tensão persistente, preocupação crónica e fadiga, sono perturbado, dores de cabeça, hipervigilância, irritabilidade, agitação, incapacidade de concentração, problemas digestivos e outros problemas físicos, ataques de pânico, paranóia e uma miríade de outros debilitantes sintomas psicológicos. E, a preocupação sobre estes sintomas, causa ainda maior ansiedade.
Preocupação com as expectativas
Preocupar-se pode também dizer respeito a querer sermos vistos pelo mundo como nós desejamos. E desejarmos ver-nos a nós mesmos como queremos ser vistos. Quando estamos investido fortemente em projetar e manter uma certa imagem ou personalidade para os outros, e isso passa a ser uma expectativa elevada e rígida, tornarmo-nos demasiado vigilantes de nós mesmos, como se alguns dos nossos comportamentos fossem uma ameaça.
Nós passamos a nos preocuparmos com a exposição. Podendo emergir problemas como o medo de falar em público, ou evitamento de exposição social.
Podemos ganhar medo de ser confrontados com quem somos e o que realmente somos. Inerentemente temos receio do desconhecido, temos relutância em sair da nossa zona de conforto. Sentimo-nos melhor quando conseguimos ter controle sobre as situações, quando são conhecidas ou muito idênticas a experiências já vividas.
Temos igualmente receio de que os outros possam vir a saber das nossas insegurança, incertezas, receios, dificuldades, o que nos leva à precaução. Mais uma vez tudo isto pode ser considerado “normal”.
No entanto, quando a preocupação sobre esses assuntos se torna excessiva, nos empurra para uma elevado foco na antecipação dos resultados e no receio dos mesmos poderem vir a ser defraudados, torna-se prejudicial.
Podemos vir a ter pensamentos do tipo: “E se eu não posso esconder meus sentimentos? Minha insegurança? Meu amor? Minha tristeza? Minha raiva? Minha carência? Minha vulnerabilidade? Meu verdadeiro eu?”
Quando entramos num ciclo negativo de nos preocuparmos com o que as pessoas vão pensar de nós e se elas sabem que temos ansiedades e inseguranças, pode ser catastrófico. Afeta-nos a autoestima e autoconfiança, aumentando ainda mais as inseguranças e as incertezas.
Então, a pessoa dedica-se arduamente em preocupar-se sobre como esconder a ansiedade e vergonha, o que só torna isso mais forte e duplamente difícil de disfarçar. Um ciclo negativamente repetitivo.
O que pode ser feito?
Então, qual é a solução para este dilema castrador? Como podemos parar a nossa preocupação excessiva? A Terapia Cognitivo-comportamental tenta levar a que as pessoas percebam que a sua preocupação excessiva é irracional e contraproducente (não serve o propósito para o qual está focada). Que não é útil, pelo contrário, aumenta a ansiedade, e não faz nada para impedir que aquilo sobre o qual nos preocupamos ocorra.
A “Catastrofização”, por exemplo, é um tipo muito comum de preocupação em que imaginamos o pior cenário possível, mesmo para eventos relativamente insignificantes. No entanto, na realidade, tais resultados cataclísmicos felizmente raramente ocorrem.
Então, porque razão continuamos a fazer isso a nós mesmos? Porque a preocupação crónica e a ansiedade “negativa“, são por definição, não racionais. No entanto, não é impeditivo que possamos vir a entender melhor a ansiedade e a preocupação. Mais conhecimento, trás mais esclarecimento, e mais esclarecimento é necessário para percebermos com o que é que estamos a lidar.
A ansiedade pode ser o nosso melhor professor. Portanto, a questão crucial é saber se estamos dispostos a parar de nos preocuparmos o tempo suficiente para perceber o que a nossa ansiedade tem para nos dizer.
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Serve para aprofundar mais plenamente o conhecimento da própria ansiedade em vez de fugir dela?
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Para ser mais presente com ela. Isso é um aviso de algum tipo? Um alarme ?
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Uma tiróide hiperativa ou talvez um sinal de alguma doença latente do foro fisiológico?
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Um subproduto de algum estimulante psicoativo, como cafeína, nicotina, cocaína ou anfetaminas?
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Um “sinal”, para ativarmos algumas ferramentas psicológicas?
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Uma necessidade urgente interior para a ação?
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Anunciar a necessidade premente de alterar a nossa vida, a nossa personalidade, os nossos relacionamentos, a nossa visão de mundo?
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Para viver em maior alinhamento com o nosso verdadeiro temperamento?
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Estabelecer um melhor equilíbrio entre as nossas atitudes e estilo de vida?
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Para buscar um novo sentido de propósito e significado espiritual?
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Encontrar um trabalho mais gratificante?
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Ou será que a ansiedade às vezes pode ser um toque de clarim a um estímulo para uma maior expressão criativa?
Devemos aprender a aceitar e a tolerar a nossa ansiedade, e que um pouco de ansiedade é o preço inevitável de ser livre, consciente, mortal e responsáveis por nós mesmos. Mas isso é necessariamente assim? No budismo, por exemplo, o sofrimento (o que certamente inclui preocupação e ansiedade) é visto como a consequência de ter muita vontade, ou apego. Apego às coisas materiais.
Desejar ter certos sentimentos e experiências, e outros não. O que coloca imediatamente a pessoa numa situação desvantajosa sempre que sente o que não quer, porque inevitavelmente em determinada altura irá sentir e ter (sentimentos e pensamentos negativos).
A reter: O incómodo da preocupação não reside no aparecimento de pensamento inquietantes na sua mente, mas sim na importância e no foco que lhes dá após o seu aparecimento.
A libertação da preocupação é muito mais fácil dizer do que fazer. E, eu também não pretendo passar a mensagem que deveremos eliminar, suprimir ou impedir-nos de nos preocuparmos, de todo. Até porque isso é na realidade virtualmente impossível de ser feito.
O que pretendo transmitir é que os sintomas da ansiedade e da preocupação são estímulos sentidos por nós, exteriores ou interiores, e que estamos inerentemente e geneticamente preparados para sentir. Não há como não sentir, ou evitar que determinados pensamentos nos cheguem à mente. Mas, aquilo que podemos fazer, é:
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Aceitar que temos uma predisposição para ter sensações desagradáveis no nosso corpo, e que elas servem um propósito: Transmitir informação.
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Que essas sensações desagradáveis, vão ativar determinados pensamentos de preocupação e ruminação no sentindo de nos protegermos da possível ameaça. E que esses pensamentos são eventos mentais e não necessariamente acontecimentos reais.
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Temos de perceber se essa proteção é necessário, se nos serve, ou pelo contrário, se nos prejudica.
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Devemos separar-nos, desapegar-nos dessas sensações e pensamentos negativos, no sentido de não reagirmos de imediato, e não nos confundirmos e fundirmos às más sensações e pensamentos de preocupação irracional.
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Agir de acordo com os nossos objetivos, valores e desafios, preparando-nos para a ação, ao invés de agir de acordo com os medos, receios, inseguranças, que nos preparam para o evitamento.
Para aprofundar o assunto, leia os artigos:
É imperativo percebermos que a ansiedade, é exacerbada ou promovida sempre que preocupações irracionais diárias conduzam a pessoa à evasão ou evitamento.
Quando as nossas preocupações irracionais são cuidadosamente examinadas e percebidas como conclusões lógicas, o medo profundo instala-se. O caso mais pragmático deste tipo de preocupação que leva ao medo é o desenvolvimento do Transtorno Obsessivo-compulsivo. Normalmente trata-se de ideias exageradas e irracionais com a saúde, higiene, organização, simetria, perfeição ou manias e “rituais” que são incontroláveis ou dificilmente controláveis.
Como Woody Allen disse uma vez: “Eu não tenho medo da morte. Eu só não quero estar lá quando acontecer.”
Mas o que acontece quando não temos mais medo de ter medo, mas sim aceitá-lo como mera contrapartida necessária para a vida, como a escuridão é a contrapartida à luz? Quando abraçamos o sofrimento como a contrapartida necessária do prazer, alegria e felicidade? Pólos opostos da mesma existência.
E quando vemos que não há realmente nenhuma coisa como a segurança na vida. Exceto a sensação de segurança que vem de dentro. A segurança que iremos acabar por encontrar uma maneira de lidar com a situação, e que nada é permanente e imutável. É como que encontrar uma “sabedoria na insegurança”.
Percebemos que a nossa constante preocupação sempre foi uma maneira de negar esses fatos existenciais. De escapar do presente. De evitar a nossa ansiedade existencial. De tentarmos convencer-nos de que temos mais controle sobre a vida do que realmente temos.
Devemos enquadrar de forma racional e assertiva as nossas ilusões de controle, aceitando a nossa impotência em relação à vida e à morte, ou a querer antecipadamente certificarmo-nos que determinada coisa irá acontecer como pretendemos.
Devemos aceitar-nos com as condições humanas que possuímos, incluindo a nossa ansiedade, isso pode ser extremamente libertador para que possamos mudar aquilo que somos ou pretendemos vir a ser. Este tipo de entendimento pode permitir-nos parar de preocuparmo-nos tanto, e continuarmos a viver de forma agradável a nossa vida.
O futuro é um mundo de possibilidades que acabará sempre por revelar-se, tanto mais, quando mais trabalharmos para promover a possibilidade que queremos ver realizada. Faça planos e decisões necessárias.
Mas não se focalize apenas sobre isso ou nos seus resultados desejados. Focalize-se igualmente no que está acontecendo agora, neste exato momento, no que lhe provoca ansiedade, no que é doloroso, difícil ou irritante, e não antecipar ansiosamente o que pode ou não acontecer.
Na presença da ansiedade, da preocupação excessiva e ruminação, quando entendidas como prejudiciais, foque-se em estratégias de redução das sensações físicas desagradáveis, e em estratégias que permitam acalmar a mente. Para aprender e praticar algumas dessas estratégias, leia os artigos:
Palestra em vídeo
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Abraço,
Miguel Lucas
Olá, meu querido, tudo bem?
Eu acho que, de certa forma, a preocupação tem sua importância, é como se fosse uma precaução… o que seria de nós se não nos preocupássemos com o amanhã? Porém, como vc bem enfatizou o execesso dessa preocupação e dos pensamentos negativos só prejudica e destrói.
Despertou a minha atenção também vc ter falado que a preocupação tem os seus sinais físicos… geralmente, quando fico preocupada, estressada, nervosa, eu tenho cólicas e sinto falta de ar… sendo que eu tenho problemas pessoais e sinto esses sinais físicos, o que seria melhor para mim procurar um psicólogo ou um psiquiatra?
E enfim, seu texto é magnífico, sou fã do seu blog
parabéns!
http://diariodagarotadevariasfaces.blogspot.com/
visita o meu blog? me dá esse prazer 😉
Ola gostei muito do seu blog, é reconfortante saber que não estamos sós…sofro de ansiedade há uns 7 anos, tive uns cinco episódios de ataque de pânico em média um por ano. Mas só hj compreendo que alèm de ser muito ansiosa tenho preocupação excessiva com tudo. Vou procurar ajuda, tentei me restabelecer sozinha, mas atualmente estudo para concurso e o meu nível de ansiedade está extremamente alto e só essa semana tive dois episódios de agorafobia. Vc atende no Rio de janeiro? Senão pode me indicar um especialista? Obrigada por tudo!
Olá Glauce, obrigado pelo comentário.
Os problemas de ansiedade são comuns a todos nós, o que pode variar é o deconforto e a intensidade dos sintomas associados, assim como a grau de problema. POr vezes a ajuda profissional é o mais aconselhado, hoje em dia as ajudas já são muito eficazes, pelo que sofrer é desnecessário.
Olá a Escola Psicologia não tem consultório físico, os nossos serviços são via internet. Pode aceder às nossas consultas de psicologia online em: http://www.escolapsicologia.com/sessoes-online/
Abraço
[…] eficaz quando se trata de lidar com o medo. Alguns tipos de medo estão associados a preocupação elevada com algo que possa vir a acontecer no futuro. Este tipo de cenário pode gerar elevada ansiedade, […]
Que texto maravilhoso! vou ler e reler, me identifiquei em muitos apontamentos. Uma aula que nos remete a nos conhecer melhor e agir a nosso favor.
Muitas vezes, Obrigada!