A ideia da saúde mental como a conhecemos no passado, chegou a um beco sem saída. Ao debruçar-se mais nos aspetos dos transtornos, focando a sua atenção nas incapacidades e disfunções das pessoas, tornou-se demasiado hermética no modelo da doença mental e não propriamente numa abordagem virada para a promoção da saúde mental. Na atualidade, este antigo modelo não adiciona muita coisa relevante para a vida das pessoas.
Se você fizer uma pesquisa no Google para a palavra “saúde mental”, a maioria do que encontrará descreve a doença mental, não a saúde mental. Ambos, profissionais e investigadores concentraram-se mais na compreensão e tratamento do transtorno emocional, do que em descrever o que é a saúde e como promovê-la e/ou construí-la.
Da velha à nova forma de saúde psicológica
Felizmente tem vindo a surgir na psicologia positiva uma nova forma de olhar a saúde mental, exatamente pelo prisma principal que é focar muito mais a atenção nos mecanismos do bem-estar, superação e florescimento do que propriamente nos mecanismos da perturbação. A saúde psicológica está a ser repensada para o bem de todos nós. Existe agora a possibilidade de interpretar, implementar e alinhar emoções, pensamentos, atitudes, valores e comportamentos por uma perspectiva positiva.
Neste artigo vou explicar o que nos trouxe até à desesperança do modelo antigo, e vou esboçar algumas características de saúde psicológica que refletem novos desafios e realidades do mundo tumultuado de hoje.
Primeiro, vamos olhar para aquilo que nos encaminhou para a criação do modelo antigo. Os objectivos do tratamento para conflitos emocionais através de medicamentos, psicoterapia ou uma combinação dos dois, têm sido na sua essência, formas de gestão, formas de enfrentamento e adaptação. Ou seja, a gestão de conflitos emocionais que criam disfunção e sintomas como depressão e ansiedade.
Lidar com o stress ou conflitos no local de trabalho, nos relacionamentos e outras partes da vida. E, boa adaptação ou adequação às normas, valores e comportamento convencionais da sociedade ou grupos que as pessoas façam parte. Esses objectivos são úteis, por si só, mas há três problemas com eles:
1 – Um deles é que estas abordagens não funcionam tão bem no mundo de hoje, um mundo de incerteza, revolta, e mudanças rápidas.
2 – Outra é que as normas e comportamentos que você se adapta, mesmo com sucesso, podem não ser saudáveis na sua essência. Isso pode criar novos conflitos que não estavam aquando da adaptação. Por exemplo, tentar adaptar-se a uma cultura de trabalho insalubre, ou adaptar-se a viver dentro de um relacionamento destrutivo ou abusivo.
3 – Um terceiro problema é que a visão de saúde baseada nos pressupostos de gestão, enfrentamento e adaptação é simplesmente insuficiente para lidar com os desafios psicológicos que as pessoas enfrentam no mundo atual.
De acordo com este novo paradigma de mudanças bruscas na sociedade que abalam o equilíbrio emocional a espaços curtos, também o velho conceito de psicoterapia e/ou consulta psicológica deixou de ser um modelo adequado para ajudar as pessoas a lidarem com os problemas do dia-a-dia.
O modelo antigo baseado no processo alterou-se por necessidades impostas da dinâmica da vida atual para um modelo consultivo orientado para os resultados. O modelo antigo orientava-se muito mais para o problema específico da pessoa não dando relevância ao enquadramento da vida da pessoa e ao fornecimento de ferramentas promotoras de saúde psicológica.
Abordei este assunto no artigo: Consulta psicológica, resolver os problemas do dia-a-dia.
Os desafios psicológicos incluem uma mistura de questões sociais, económicas e políticas que afetam a nós mesmos, aos outros e ao nosso futuro coletivo. O campo da saúde mental está muito preso dentro de uma mentalidade do século XX, que assumia uma relativa estabilidade e mudança previsível na sociedade em geral e na vida pessoal em particular. Mas, como eu descrevo abaixo, o mundo de hoje está em constante alteração, com rápidas mudanças tecnológicas e interligação global.
Esta mudança tem empurrado a vida das pessoas e as expectativas de futuro para um turbilhão de decisões constantes. Despertou medos contínuos e fez com que as velhas formas de lidar com as mudanças e conflitos ficassem ineficazes.
A reter: A adaptação à norma que tanto se desejava, passou a ser um mito.
Além disso, apesar da prevalência da psicoterapia e medicamentos psiquiátricos, os conflitos emocionais continuam a permear a nossa sociedade. Perturbações psicológicas como a ansiedade e depressão tem vindo a aumentar entre as pessoas “funcionais”. Ou seja, quer dizer que uma pessoa funcional, “sem doença mental” tal como poderia ser diagnosticada no antigo modelo, sofre hoje de estados ansiosos e deprimidos.
Relacionamentos fracassados, casos de divórcio são uma constante, apesar da prevalência de terapia de casais e de programas “salvadores de relacionamentos”. Egoísmo desenfreado, narcisismo e mentalidades “fechadas” influenciam negativamente as vidas pessoais e as políticas públicas.
A investigação tem trazido esclarecimento sobre o papel dos medicamentos e do poder de placebos para a ansiedade e depressão, revelando uma ausência de provas da eficácia da grande maioria desses medicamentos, ou pior, que podem alterar o cérebro de maneira prejudicial. Por exemplo, novos estudos têm vindo a desacreditar a velha teoria do desequilíbrio químico como a “causa” da depressão.
Outros mostram que o efeito placebo de medicamentos é muito mais profunda do que se pensava anteriormente. Proeminentes investigadores estão agora criticando o uso excessivo e mau uso de medicamentos psiquiátricos em geral, e como eles podem afetar o cérebro, a longo prazo.
O impacto psicológico no mundo de hoje
Há um novo ambiente mundial em que os profissionais de saúde mental têm de conseguir reconhecer e levar em consideração: as rápidas transformações que todos sentimos no nosso dia-a-dia. Existe uma turbulência constante e altamente interconectada entre todos os povos do planeta e, cada vez mais fica clara esta nova realidade que se apresenta a todos nós como a nova “normalidade”. A antiga visão da saúde psicológica nem sequer reconhece o impacto dos atuais desafios, muito menos fornece uma visão de saúde psicológica no contexto deste “novo normal”.
O antigo modelo continua preso às premissas de um pensamento em torno de uma “normalidade estável” e está desadequado a esta nova realidade que nos empurra a implementar uma nova mentalidade baseada agora numa “normalidade temporária”
Ironicamente, grande parte do mundo dos negócios está mais em sintonia com as novas realidades e do impacto que têm nas organizações, na noção de liderança e na carreira das pessoas. Esta perspectiva oferece uma imagem melhor acerca do que consiste a saúde psicológica, hoje, e daquilo que a ajuda a construir. O mundo empresarial de hoje tornou-se num ambiente de caos, incerteza e perturbação em progresso. Tudo isto leva a que o ritmo de interrupção aumente, especialmente com a adoção da mobilização social global, redes sociais móveis e de outras novas tecnologias.
O modelo que irá definir a próxima época é incerto, nenhuma imagem credível de longo prazo emerge. Este novo modelo de vida e consequentemente de saúde psicológica será marcado por mais fluidez do que por qualquer novo paradigma estabelecido. O padrão que se reconhece em tudo isto, é que não há um padrão.
O insight mais valioso é que estamos a caminhar num sentido crítico, num momento de transformação constante que deita por terra as velhas formas de adequação à vida e ao equilíbrio emocional.
A nova imagem da saúde psicológica
A psicologia daqueles que são capazes de não apenas sobreviver, mas também prosperar no novo ambiente de negócios e na sua vida, inclui elementos psicologicamente relevantes para a saúde em geral. É a mentalidade global que o novo modelo de empresas descreve como sendo um ambiente que abraça a instabilidade, que tolera, e gosta dela. Eu acho que é possível descrever alguns temas chave da saúde psicológica e alguns dos traços que caracterizam uma personalidade saudável no mundo de hoje.
Apresento alguns:
A – Ser capaz de sair do seu modelo de “guiado pelo ego” e ver o mundo de uma forma mais ampla, a perspetiva de não julgamento. Como subir ao último andar do prédio e olhar a rua do alto e não ao nível do chão. Alargar o ponto de vista é palavra de ordem.
B – Uma orientação de vida muito além de apenas extrair valor para si mesmo, em tudo o que você está envolvido: a sua relação, o seu trabalho deve contribuir valor a algo que é maior do que apenas o seu próprio interesse. Que inclui um foco em contribuir para o bem público.
C – Uma orientação altamente pró-ativa que abraça a evolução contínua, crescimento, novas aprendizagens e abertura para o desconhecido, que está um pouco além do que você acha que é capaz de fazer.
Estes temas conduzem-nos a uma boa definição geral de saúde psicológica: Uma mentalidade que cresce e aplica capacidades emocionais, cognitivas, criativas e de relacionamento com ações que ajudam a manter e melhorar o bem-estar de todos. Uma mentalidade baseada numa compreensão de que todas as vidas do planeta estão interligadas e interdependentes; uma realização e perspetiva que alimenta ações com compaixão e empatia. Uma mentalidade ecológica. Esta mentalidade ecológica está baseada no pressuposto que é adequada a si mesmo, aos outros e ao mundo em geral.
A partir desse quadro geral, algumas das características específicas da personalidade saudável incluem a construção, desenvolvimento e esforço no sentido de desenvolver:
Autoconsciência
Esforce-se para ficar ciente das questões familiares e conflitos que permaneceram no subconsciente, longe de uma análise mais detalhada e que foram minando as suas emoções e comportamentos de maneiras autoincapacitantes. Deve ganhar mais consciência dos seus sentimentos e pensamentos, sobretudo dos negativos, pois podem estar a derrotá-lo desnecessariamente. Ganhe entendimento sobre os seus pensamentos e sentimentos negativos e encare-os como uma realidade, sem que necessariamente tenha de sofrer com isso.
Expliquei de forma mais detalhada este assunto nos artigos:
Flexibilidade cognitiva
A flexibilidade de pensamento, especialmente os pensamentos lineares e não lineares. Ambos são necessários. Os pensamentos lineares dizem respeito às normas, autodisciplina e procedimentos comportamentais, o pensamento não linear ou improvisado utiliza a criatividade e a mentalidade virada para a solução construtiva. Ambos são capacidades importantes para uma vida psicologicamente saudável , nos dias de hoje.
Use uma variedade de possibilidades. É exatamente disto que trata a flexibilidade de pensamento. Opções, caminhos múltiplos, reforçar os opostos para que se possa estabelecer um equilíbrio. O equilíbrio, tem a ver com a capacidade que cada um de nós tem para driblar a vida com ambas as mãos. Tem a ver com a oportunidade de utilizarmos as várias possibilidades que estão ao nosso alcance.
Emoções positivas
Especialmente as emoções que contribuem para a colaboração, para as ligações mutuamente gratificantes e bem-estar interior, especialmente: compaixão, aceitação, empatia e abertura às diferenças. A investigação tem vindo a comprovar que este tipo de emoções positivas estão ligadas com a saúde geral e são capazes de autodirigir o reforço, por meio da neuroplasticidade do cérebro.
Valores pessoais
Desenvolva os valores que promovam o bem-estar e crescimento compartilhado da comunidade, e não exclusivamente de autointeresse e valores orientados apenas para si mesmo. Por exemplo, valores a respeito de “sucesso” na vida podem ser definidos menos por critérios financeiros e de autointeresse e mais, pela contribuição do bem comum.
Falei acerca dos valores pessoas como um regulador dos nossos estímulos e como um orientador para a vida, leia o artigo: Autorregulação, para sentir-se melhor foque-se no mais importante.
Transparência
Incluindo a exposição e franqueza sobre as suas ações, motivos e objetivos, em vez de tentar esconder ou ofuscar. Pondere sobre abraçar o impacto positivo da transparência, que irá cada vez mais transformar positivamente a vida pública e privada.
Expliquei este assunto de forma mais abrangente no artigo: Honestidade emocional, uma mais valia para si e seus relacionamentos.
Impacto estratégico
Na aplicação das suas ações, oriente-as em direção a uma visão de crescimento, liberdade e desenvolvimento das múltiplas facetas do seu ser, abrangendo as áreas emocionais, relacionais, criativas, espirituais, físicas e intelectuais. Isto inclui uma atenção redobrada sobre o impacto a longo prazo que as suas ações podem vir a ter em vidas futuras, e que possam beneficiar do seu legado.
Este é apenas um esboço de uma nova imagem da saúde psicológica que pode ser recuperada da zona adormecida que o modelo antigo ocupa. Os desafios da dinâmica do novo mundo contêm muitos perigos que podem descarrilar em autossabotagem e estagnação.
Abraço,
Miguel Lucas
Oi Miguel tudo bem contigo? Adorei o texto. Como a gente sabe, tudo aquilo que direcionamos nosso olhar,nossa energia e repetimos, ganha força. Então, concordo totalmente com o texto. Está mais do que na hora de reforçarmos e colocar os holofotes na saúde mental. Eu acredito que, quanto mais vínculos de afeto tivermos, quanto mais troca afetiva tivermos, menos sofridos ficaremos. Isso começa cedo,ainda na gestação.
Se a criança não for alimentada afetivamente corretamente e de forma saudável, provavelmente passará longo período tentando preencher este vazio, aquela sensação de que está sempre faltando algo mas a gente não sabe muito bem o quê, até que um dia consiga elaborar e superar.
Daí a importância de uma psicologia e um profissional que ajude a pessoa a melhorar, se fortalecer, se auto nutrir e não que fique somente mexendo nas feridas. Enfim, parabéns pela abordagem!
Abraço!
Olá Fernanda, obrigado pelo comentário
Fico muito agradecido com a sua colaboração e com as suas ideias. É importante reforçar-se a noção de que temos de nos orientar para um novo paradigma da saúde mental, com menos catalogações e com mais soluções práticas a pensar em quem sofre com os problemas do dia-a-dia.
Tudo de bom para você
Abraço
Oi tudo jóia Miguel Lucas,venho lhe parabenlizar pelo seu trabalhos e artigos,esses que estão me ajundando muito no meu dia a dia,ttendo uma nova maneira de pensar sobre a vida.Estou até mais tranquilo!!Também adoro partilhar e indicar seu blog para amigos e familiares. Um Abraço e que deus continue iluminando sua vida.
Oi Carlos,Sou Diretor de Marketing da Locaweb, acabo de ler o seu post, e tenho a concordar em patres com o seu texto. Realmente a Locaweb cresceu, mas estamos trabalhando muito para manter a qualidade dos servie7os e do atendimento que sempre foram os principais diferenciais da empresa.Ressalto que je1 estamos criando novas ferramentas para evitar que ocorra a desativae7e3o autome1tica de um site ou um blog de um cliente que trabalha com a Locaweb ha mais de 10 anos e outras diversas regras, isso faz parte de um trabalho de CRM que esta em andamento e espero que com isso diversos problemas como esse sejam sanados. Pee7o desculpas pela desativae7e3o e pode ter certeza, que ne3o viramos um mini monopf3lio e continuamos como sempre preocupados em satisfazer nossos clientes.
Olá, boa tarde Miguel Lucas, tudo bom?
Quero agradecer as informações importantíssimas que tenho lido em seus textos, as quais tem enriquecido o meu trabalho do curso de pós-graduação sobre a importância das atividades físicas na qualidade de vida do deficiente visual.
Parabéns