O termo autorregulação refere-se aos inúmeros processos de pensamento que gerenciam os nossos impulsos e emoções. A autorregulação ajuda-nos a aceder aos raciocínios que nos permitem ser assertivos, inibindo os impulsos primários e orientando a nossa atenção para a construção de uma resposta adequada à situação.
Quando interagimos uns com os outros, muitas das vezes não dizemos diretamente ou literalmente aquilo que pensamos, e por um bom motivo: estamos sujeitos às regras da nossa cultura para interagir de uma maneira que respeite os sentimentos e espaço pessoal daqueles que estão interagindo connosco. A ferramenta mais importante para promover a interação efetiva é a autorregulação.
VALORES: UMA REFERÊNCIA PARA A AUTORREGULAÇÃO
No artigo: Que tipo de pessoa você quer ser? abordei a questão do benefício de orientarmos a nossa vida através dos nossos valores (daquilo a que damos significado). No artigo: Desapegue-se da sua personalidade, aprenda a desempenhar um papel falei que a capacidade de agirmos de acordo com o que queremos (seguindo os nossos valores) reside no intervalo entre um estímulo e a consequente resposta. É exatamente neste intervalo de tempo (entre o estímulo e a resposta) que a habilidade para aplicarmos a autorregulação pode expressar- se. E esta expressão é visível na observação dos nossos comportamentos e atitudes.
Mas, para aplicar eficazmente a autorregulação temos de ter um indicador que nos sirva de referência para que possamos perceber em relação ao que é que devemos regular as nossas emoções, sentimentos, comportamentos e pensamentos. O ponto de referência mais credível são os nossos valores, como por exemplo: amor, compaixão, perseverança, integridade, entusiasmo, cidadania, igualdade,entre outros.
Para termos uma noção mais exata de como podemos aprender a utilizar a nosso favor a autorregulação, devemos levar em consideração que não somos seres cristalizados, imutáveis. Partindo deste pressuposto, a referência sobre a qual nos vamos regular flui, muda e altera-se de acordo com os nossos objetivos ao longo do tempo.
Se partimos do principio que aquilo que mais muda durante 24 horas de um dia preenchido de afazeres dispares, serão por certo os nossos estados emocionais, estes provavelmente não serão os melhores orientadores. As nossas emoções e sentimentos são fluídos, voláteis, impermanentes, pelo que não são a referência mais credível na qual nos podemos basear para regularmos os nossos comportamentos. Então quais são essas referências? Tal como já referi: São os valores!
Em grande parte dos artigos tenho vindo a expressar a informação que não somos os nossos sentimentos, nem pensamentos, nem comportamentos. Nós somos aquele que sente, pensa e age de acordo com um conjunto de valores, motivações, interesses e objetivos.
Desta forma, se agirmos erradamente e comprovamos não estarmos alinhados com os nossos valores ou interesses, temos sempre a possibilidade de numa próxima oportunidade agir de forma mais adequada. Se fracassarmos, não nos tornamos automaticamente num fracassado.
Se agirmos com hostilidade, não passamos necessariamente a ser daí para o futuro pessoas hostis. Mas não passamos a ser se conseguirmos regular-nos de acordo com as referências que escolhemos para orientar as nossas escolhas e caminhos a tomar na vida. Sem isto, ficamos à mercê das nossas emoções, que são voláteis, temporárias, fluídas e subtis.
AUTORREGULAÇÃO: UMA HABILIDADE A APRENDER
A autorregulação pode ser considerada como uma habilidade extremamente importante na sociedade atual, ela está relacionada com muitos resultados positivos, como o sucesso na escola, na universidade, no trabalho, o status social e económico, com a saúde e também com a satisfação nos relacionamentos. A ausência de autorregulação ou interferência nos mecanismos e habilidades que a suportam, está muitas vezes relacionada a problemas nas relações interpessoais, vício, e problemas psicológicos.
Estudos recentes sobre a qualidade da autorregulação consideram-na como um traço de personalidade e uma habilidade. Pessoas com capacidade de autorregulação elevada têm mais facilidade em controlar os seus impulsos do que pessoas com capacidade de autorregulação baixa. No entanto, enquanto habilidade a autorregulação pode ser treinada: atos repetidos de autorregulação potenciam a autodisciplina e a capacidade de direcionarmos a nossa energia para aquilo que é mais importante para nós (Muraven & Baumeister, 2000).
A reter: A autorregulação, por exemplo, pode ser a capacidade para não fazermos aquilo que não queremos fazer.
EMOÇÕES: UMA FORÇA EM MOVIMENTO
Pesquisas mostram consistentemente que a autorregulação é necessária para reforçarmos o nosso equilíbrio emocional. Na perspectiva comportamental, a autorregulação é a capacidade de agir no seu melhor interesse a longo prazo, de forma consistente com os seus valores mais profundos.
A violação dos seus valores mais profundos pode originar sentimento de culpa, vergonha e ansiedade, que minam o bem-estar. Na perspectiva emocional, a autorregulação é a capacidade de acalmar-se quando está chateado, irado, fulo ou descontrolado e motivar-se, energizar-se e elevar-se quando você está para baixo. A autorregulação estabelece assim uma forte relação com a capacidade que cada um de nós tem para gerir as emoções.
Se você pretende melhorar a sua habilidade de autorregulação, é importante começar por compreender a função das emoções em geral e, especificamente os sentimentos. As emoções são uma tremenda energia em movimento. A palavra “emoção“, derivado do latim, significa literalmente “para se mover.”
Os antigos acreditavam que as emoções moviam os comportamentos. Nos tempos modernos, nós dizemos que elas motivam o comportamento. As emoções energizam-nos a fazer as coisas através do envio de sinais químicos para os músculos e órgãos do corpo, elas preparam-nos para a ação.
A reter: Emoção é movimento
MOTIVAÇÕES BASE:
Seja subtilmente ou intensamente, consciente ou inconscientemente, ostensivamente ou dissimuladamente, todas as emoções têm uma das três motivações básicas:
- Aproximação
- Evitamento
- Ataque
Na motivação “aproximação“, pretendemos obter mais de alguma coisa, experimentar mais, descobrir mais, aprender mais, ou apreciar mais, queremos aumentar o nosso valor, o valor de algo, ou dar mais atenção a algo. As emoções típicas na “aproximação” são: interesse, prazer, compaixão, confiança e amor.
Os comportamentos comuns são: aprendizagem, encorajamento, relacionamento, negociação, cooperação, deleite, persuasão, orientação, definir limites e proteção.
Na motivação “evitamento“, pretendemos ficar longe de algo, diminuir o valor ou importância de algo e dar menos atenção a algo. As emoções típicas são: medo, perda, vergonha e orgulho. Os comportamentos comuns de evitamento são: ignorar, rejeitar, retirar-se, demitir-se e restringir.
Na motivação “ataque“, pretendemos desvalorizar, insultar, criticar, prejudicar, coagir, dominar, incapacitar ou destruir. As emoções de ataque são a raiva, ódio, desprezo e repugnância. Comportamentos característicos de ataque são a exigência, manipulação, domínio, coação, ameaça, briga, prejudicar, e abusar.
SENTIMENTOS
Os sentimentos são a componente consciente das emoções que supostamente melhor conseguimos descrever acerca do que pensamos estar a sentir no nosso corpo, relativamente a algo (situação, pensamento, comportamento, atitude, entre outros), mas por vezes mal compreendidos.
Em contraste com a simplicidade das motivação básicas, os sentimentos são complexos, estão em constante mudança, e sujeitos aos nossos humores (como a depressão), sensações (como calor, frio, prazer, dor, conforto, desconforto) e estados fisiológicos (como a fome e o cansaço). Tudo isto pode (erradamente) sentir-se como emoções, razão pela qual muitas vezes atribuímos (erradamente) um significado psicológico para qualquer coisa que possamos sentir como desconfortável, desagradável e angustiante.
Por vezes, grande parte dos nossos problemas psicológicos, ansiedade, mal-estar emocional, infelicidade e descontentamento surgem por más interpretações que fazemos daquilo que sentimos. A sensação de desconforto pode parecer-se muito semelhante a emoções negativas conduzindo-nos a uma terrível confusão, fazendo que a nossa atenção seja dirgida para sentimentos (catalogando o que sentimos), ao invés de perceber as nossas motivações.
Provavelmente tornámo-nos demasiado sensíveis ao desconforto, pensamentos negativos, sensações corporais de incómodo, frustração, fracasso, erros, fazendo com que rapidamente saltemos para conclusões precipitadas acerca do quão o nosso bem-estar está a ser afetado e o quão miserável e doloroso é estar assim.
A repugna exagerada originada pelas más interpretações fundadas na catalogação de sentimentos como: estou desesperado, estou triste, estou infeliz, estou furioso, sou um fracasso, estou desta ou daquela forma, retira-nos a possibilidade de apenas estarmos a sentir coisas que estamos preparados para sentir, sem que necessariamente tenhamos de generalizar para o nosso estado geral ou para a nossa vida em geral.
Nos mamíferos, os sentimentos não são fins em si mesmos, mas um meio que impele a focar a atenção em algo, então devemos agir sobre a motivação da emoção presente. Por exemplo, se você estiver interessado em algo, mas não fizer nada para obtê-lo, a emoção de interesse geralmente inconsciente começa a fazer sentir-se como excitação, antecipação, um palpite irritante, ou ansiedade.
Fato a considerar: Pode dizer-se que você não está a ter um problema de ansiedade, mas sim uma reação fisiológica (que se apresenta em forma de informação subtil: sensações de mal-estar no corpo) ao fato de não estar a obter o que deseja, ou querer obter o que deseja.
Se você tiver ignorado alguém que ama e não se aproxima para comprimentá-lo e interagir, a emoção geralmente inconsciente de culpa vai começar a fazer sentir-se como frustração, impaciência, ansiedade ou depressão. Mais tarde você vai pensar porque razão está sentir-se assim, e se tem esse sentimento, algo de errado está a acontecer.
O que aconteceu é que o seu organismos fez você sentir-se mal de forma muito subtil, porque você não se comportou de acordo com aquilo que valoriza: a pessoa que ama. Se você for interpretar o sentimento e ignorar a sua consciência ou a razão porque ama aquela pessoa, pode começar a duvidar do sentimento que tem acerca dela. O seu problema teve inicio. Uma total confusão de sentimentos, pelo fato de querer interpretar psicologicamente algo que simplesmente tinha de ser sentido como: “upss, eu devia ter cumprimentado“.
Como pode então resolver isso sem que tenha de colocar tudo em causa? Aproxima-se da pessoa e pode dizer: “A minha atenção estava direcionada para algo que eu precisava de resolver e distraidamente ignorei-te“.
Quando agimos sobre a motivação básica das emoções, temos pouca ou nenhuma consciência dos nossos sentimentos. É assim que você pode interessar-se por alguma coisa, olhar para o relógio e perceber que algumas horas passaram, durante o qual, não tinha consciência dos seus sentimentos. É de igual forma que podemos não prestar atenção a alguém que amamos através da motivação de evitamento e ficarmos surpresos quando o parceiro nos acusa de o ignorarmos, o que estavamos inteiramente inconscientes de estar a fazer.
Claro, você pode tornar-se consciente dos sentimentos, se você refletir sobre eles, mas por certo irá interferir com a motivação e alterar o comportamento, bem como distorcer o sentimento. Por exemplo, você pode provavelmente recordar um momento romântico, como caminhar na praia ou estar deitado em frente a uma lareira acolhedora, quando o seu parceiro quase arruinou tudo, perguntando: “O que você está sentindo agora?” Você teve que parar de compartilhar interesse e prazer e pensar sobre o que é sentir-se a compartilhar interesse e prazer.
Leia: Como se sentir bem
INTERPRETE OS SEUS SENTIMENTOS COM BASE NOS SEUS VALORES
A auto-regulação é mais atingível quando focada em valores, em vez de sentimentos. Os nossos sentimentos deves ser avaliados como sinais sobre a realidade, ou melhor dizendo sobre a percepção que temos da realidade.
Por outras palavras, os sentimentos são um meio de autorregulação, ao invés de um fim em si. De fato, a autorregulação é difícil de ser atingida quando focamos a nossa atenção apenas nos sentimentos, simplesmente porque o foco amplia-se, expande-se e distorce-os.
Exemplo 1: “Eu sinto-me mal …”. Focaliza a atenção sobre o sentimento ruim, que invoca explicação, avaliação, justificativa, e muitas vezes a interpretação dos sentimentos.
Exemplo 2: “Isto é o quão ruim eu me sinto …. Estas são as razões pelas quais eu me sinto mal …. Eu tenho o direito de sentir-me mal …. Isto é o que os sentimentos ruins dizem sobre mim ou dos que me rodeiam …. “
Nos exemplos apresentados anteriormente, a pessoa foca-se no que supostamente está errado. Se você culpa outra pessoa pelos sentimentos que está a experienciar, provavelmente irá estimular os motivos para a retaliação, impedindo-o de melhorar o que está realmente a causar os sentimentos negativos.
Os sentimentos são uma parte importante de como nós criamos significado e como motivam o nosso comportamento. No entanto, os sentimentos não são os únicos a contribuir para que tal suceda, e raramente são o aspeto mais importante para a compreensão do complexo significado dos nossos comportamentos.
Na verdade, o foco apenas nos sentimentos sem considerar os valores promove mais o desenvolvimento de vícios, compulsões e problemas psicológicos do que comportamentos benéficos adequados e ajustados.
Sermos consistentes na habilidade de utilizarmos eficazmente a autorregulação requer foco nos nossos valores mais profundos, em vez de apenas nos sentimentos. A violação dos nossos valores, invariavelmente, produz sentimentos ruins, enquanto se nos movimentarmos e orientarmos nos valores, eventualmente, estaremos a contribuir para nos sentirmos mais autênticos, capacitados e com bem-estar emocional.
Abraço,
Miguel Lucas
Autorregulação é uma matéria que pretendo praticar mais em minha vida. Essa aula sobre os sentimentos foi ótima. Tenho sério problemas em identificar os meus sentimentos, sendo assim, caio sempre nos mesmos erros. Isso me provoca muita ansiedade e insegurança. Mas, como li no artigo, não vou fazer de meus sentimentos um fim, e sim aprender a criar valores que me sirvam. Acho que isso tem que ser feito logo, por questão de sobrevivência, pois sou facilmente manipulado por ser confuso e não saber nunca o que quero.
olá Alan, obrigado pelo comentário
Vejo que o artigo foi ao encontro de algumas coisas que provavelmente já faziam parte dos seus objetivos. Agora conscientemente e com mais informação a processo fica mais facilitado. Fico esperançado que consiga ir implementando essa nova forma de autoregulação.
Abraço
Gostei imenso do artigo creio que se for a segui tudo isto as coisas irao me correr bem.
Nossa! Parabéns pelo seu trabalho, voce é S.U.P.E.R.L.A.T.I.V.O, eu tenho dificuldades de compreensão na leitura, acredito eu devido aos 20 anos que vivi na Itália. Entretanto seus videos eu consigo compreender, Muito Obrigado seu trabalho é muito importante para nos! Que Deus o abençoe ricamente! Abs Fah
Este artigo foi de muita ajuda para mim. Creio, que pelas minhas atitudes de deixar o sentimento agir pelas minhas ações me frustrei muito em várias situações em meus passados relacionamentos, mas depois de ler esse "estudo do controle dos sentimentos" não agirei pelos sentimentos de forma a ter maus pensamentos e resultantemente trazer maus sentimentos, agirei pela razão. Obrigado!!!
Olá bom o que quero dizer que achei o artigo muito bom , pois a problemas qual vivo a anos por um simples fato não entender como essa nossa psicologia funciona .
Pois quero viver um modo de vida diferenciado,
Gostaria de saber como faço para falar com vc,gostei demas da forma como coloca as coisas,estou precisando verdadeiramente de ajuda.
Miguel Lucas, agora mesmo passei por uma situação dificil,fiquei sabendo que a filha da amante do meu Pai, esta doente….e em conversa com minha irmã…disse:vai ser bom para ela sofrer um poko..se bem que a menina é inocente (é adulta)…teria que ser nela…logo após ter dito..prestei atenção no que eu disse E SENTI… e me recriminei..mas a verdade é que senti…que se ela passa-se por um sofrimento ela merecia….e isso me pertubou muito pois …não queria sentir assim…me senti au por querer o mau de alguem mesmo alguem que fez minha mae sofrer muito ..minha famía eu etc etc…e dai em diante..os sintomas começaram…bolo na garganta, tensão,dor de cabeça,dormencia ,suor..mais anida quando minha irmã..que não gosta dela…disse que jamais ela desejaria uma coisa dessas.(me senti horrivel)..( detalhe..a 3 semanas atras eu coloquei ela nas orações que faço..então não entendi essa reação e esse sentimento que aconteceu)
.alias sou muito tirana comigo em relação a sentimentos emoçoes negativas…pois não quero ser má…e toda vez que tenho um sentimento mau como esse..que tive choro, e fico pessima…por não querer ser má…mais a verdade é que tenho raiva, magoas de tudo que fizeram comigo…e as pessoas que conheço parecem tão bondosas parecem que não tem esses sentimentos…e é dificil aceitar algo que para mim é negativo é mau e vai contra o que eu acredito ser bom a ceitavel contra oq eu relamente quero ser…se puder me ajudar agradeço.
Excelente.
Se conseguirmos separar, emoções do que realmente embasa nossa personalidade, ficará mais fácil conseguir o controle de nossas atitudes.
Um dos valores que mais prezo, e me orienta muito é a justiça.
Hans Kelsen identifica a justiça como a felicidade social.
Abraços
Olá, Miguel. Quero agradecer pelos seus artigos, pois desde que comecei a ler tem me ajudado de forma considerável no processo de autoconhecimento. Estou passando por uma fase delicada da minha vida, onde mudanças profundas estão se processando. Eu não me conhecia e não agia de forma consciente. Sempre repetia padrões de comportamento e pensamento que faziam a mim e outras pessoas sofrer. Hoje me sinto mais consciente, mais livre e mais amadurecido. Esse texto sobre autorregulação foi e está sendo muito importante para mim. Aliás, todos os textos desse site são profundas reflexões que me auxiliam a me tornar mais feliz, a me conhecer, me aceitar e auto amar. Gratidão!
Excelente!!! Até o final da leitura a dor emocional que estava me torturando desapareceu. Vou por tudo em prática. Desejo ardentemente desfrutar desse equilíbrio emocional.
Gratidão Miguel Lucas!