A ansiedade é um transtorno que se destaca na atualidade como consequência do mundo agitado, cheio de tensões. Este transtorno vem afetando a população de um modo geral, independente da idade. Avaliando o cenário global de transtornos psicológicos, dados internacionais mostram que as taxas de prevalência de transtornos de ansiedade na infância e adolescência variam entre 6% a 20%. Segundo um estudo de Fleitlich-Bilyk e Goodman (conforme citado por Vianna, Campos & Fernandez, 2009) estima-se no Brasil que os índices de prevalência de ansiedade em crianças e adolescentes é de 4,6% em crianças.
A estimativa de que crianças e adolescentes em algum momento de sua vida preencham os critérios de diagnósticos para pelo menos um dos Transtorno de Ansiedade é de aproximadamente 10%. Os quadros mais frequentes de ansiedade são: O Transtorno de Ansiedade Generalizada e Transtorno de Ansiedade à Separação.
Em crianças, principalmente nas menores verifica-se que diferentemente dos adultos, estas não conseguem reconhecer os seus medos como exagerados, ou irracionais. O seu desenvolvimento emocional implica sobre as causas e a maneira como os medos e preocupações tanto normais como patológicas se irão manifestar.
Exemplo: Numa manhã como tantas outras o seu filho vira-se para você e diz: “Eu não quero ir para a escola. O meu estômago dói. Por favor, não me faça ir.” Você começa a ficar frustrado e pensa: “Aqui vamos nós de novo.” O que deveria ser uma simples rotina da manhã explode num desafio assustador. Você olha para o seu filho e vê o terror genuíno. Você quer consolá-lo. Você quer aliviar a preocupação excessiva que se tornou parte integrante da sua vida quotidiana. Em primeiro lugar, tenta a lógica. “Vamos, eu coloco a música que tu gostas.” Ele não se moveu. Você tenta tranquilizá-lo.”Eu prometo que vais ficar bem. Olhe para mim … confias em mim, certo?” A criança acena com a cabeça. Poucos segundos depois, ele sussurra: “Por favor, não me faça ir.” Você fica irritado: “Vais entrar no carro agora, ou haverá consequências graves. Ficas sem iPad durante uma semana!” Ele olha para você como se o obrigasse a ir para o inferno. Ele entra no carro, derrotado. Você sente-se terrível.
Se isto soa familiar, sei que você não está sozinho. Dói ver o seu filho a ser vítima da preocupação e angustia sobre situações que, francamente, não parecem assustadoras. Mas, na verdade, para a mente da criança, essas situações são verdadeiramente ameaçadoras. Essas ameaças percebidas podem criar uma resposta real no sistema nervoso. Chamamos a essa resposta – ansiedade.
Muitas crianças faltam à escola, atividades sociais, e perdem uma boa noite de descanso apenas porque têm pensamentos de preocupação na sua cabeça. Muitos pais sofrem de frustração e um sentimento de impotência quando testemunham o seu filho neste estado a maior parte dos dias.
Não existe uma solução pronta para a ansiedade que sirva para todas as crianças, há sim uma infinidade de técnicas eficazes baseadas em pesquisas que podem ajudar a controlá-la, muitas das quais são simples de aprender. É possível os pais aprenderem. É possível ensinar às crianças estas habilidades de enfrentamento. É possível ensinar as crianças a encontrarem um significado, propósito e felicidade nas suas vidas. Para ajudar neste caminho, apresento 7 formas de aliviar a ansiedade que os pais de crianças ansiosas podem aplicar de imediato:
1 – Pare de tranquilizar o seu filho
Você sabe que não há motivos para a criança preocupar-se, então diz, “Confia em mim. Não há nada para te preocupares.” Todos nós desejamos que fosse tão simples assim. Porque é que a sua tentativa de tranquilidade cai em saco roto? Na verdade, não é porque a criança não está ouvindo. A criança ansiosa quer desesperadamente ouvi-lo, mas o cérebro não deixa isso acontecer. Durante os períodos de ansiedade, há uma rápida descarga de produtos químicos e processos mentais que são ativados com um objetivo prioritário para o corpo – a sobrevivência.
O que contribui para este fenómeno é que o córtex pré-frontal (a parte mais lógica do cérebro) é colocada em espera, enquanto o cérebro emocional mais automatizado assume as funções de resposta perante a situação stressante. Por outras palavras, é realmente difícil para o seu filho pensar com clareza, usar a lógica ou mesmo lembrar-se de como executar as tarefas básicas.
O que você deve fazer em vez de tentar racionalizar e querer que a preocupação do seu filho desapareça? Aplique os quatro passos seguintes:
- Pare – Pare por breves momentos e faça algumas respirações profundas com a criança. A respiração profunda pode ajudar a inverter a resposta do sistema nervoso.
- Enfatize – A ansiedade é assustadora. A criança quer saber que você percebe isso.
- Avalie – Assim que a criança fique mais calma, é hora de descobrir possíveis soluções.
- Desapegue-se – Deixe de lado a sua culpa; você é um pai ou educador incrível para a criança, fornecendo as ferramentas para gerir a sua preocupação.
2 – Destaque o lado positivo da preocupação
A ansiedade já é suficientemente perturbadora para a criança, por isso, não podemos passar a mensagem que estar preocupada significa que algo de errado existe com ela. Muitas crianças ainda desenvolvem mais ansiedade por estarem ansiosas ou preocupadas. Ensine à criança que a preocupação, de fato, tem um propósito.
Quando os nossos ancestrais iam caçar e colher alimentos havia perigo no ambiente, e estar preocupado ajudou a evitar ataques dos animais ferozes, como por exemplo o tigres com dentes de sabre. Nos tempos modernos, nós não temos uma necessidade de fugir dos predadores, mas continuamos com esse mecanismo de resposta ansiosa que nos protege – a preocupação.
A preocupação é um mecanismo de proteção. A preocupação soa um alarme em nosso sistema e ajuda-nos a sobreviver perante a perceção de perigo. Ensine à criança que a preocupação é perfeitamente normal, e que pode ajudar a proteger-nos, e que todas as pessoas de vez em quando experimentam isso. Às vezes o nosso sistema corporal dispara alarmes falsos, mas este tipo de preocupação (ansiedade) pode ser colocado à prova com algumas técnicas simples.
3 – Enquadre a ansiedade da criança com os acontecimentos de vida
Como você provavelmente sabe, ignorar a ansiedade não ajuda. Mas enquadrar a ansiedade com os acontecimentos de vida e falar com a criança sobre a relação que existe entre o incómodo sentido e a sua perceção dos acontecimentos, é um fator preponderante para restabelecer o equilíbrio emocional.
Criar um personagem para explicar esta relação pode tornar mais fácil o entendimento da criança. Por exemplo, você pode criar um personagem que personifica a ansiedade. Vamos chamar-lhe Óscar. O Óscar vive no velho cérebro que é responsável por proteger-nos quando estamos em perigo. Claro que às vezes o Óscar fica um pouco fora de controle e quando isso acontece, temos de falar calmamente para ele. Você pode usar esta mesma ideia com um boneco de pelúcia ou mesmo teatralizar o personagem em casa.
Personificando a preocupação ou criando um personagem tem vários benefícios. Isso pode ajudar a desmistificar as sensações incómodas sentidas no corpo das criança quando ela fica ansiosa ou preocupada em excesso. Este procedimento pode ajudar a que a criança reative a parte do processamentos lógico da informação, e funcionar como uma ferramenta que pode usar por conta própria a qualquer momento.
4 – Ensine a criança a ser um detetive de pensamentos
A preocupação é a maneira que o cérebro desenvolveu para proteger-nos do perigo. Para se certificar de que estamos realmente prestando atenção, a mente muitas vezes exagera o objeto da preocupação (por exemplo, confundindo um pedaço de pau com uma cobra). Você pode ter aprendido que ensinar as crianças a pensar mais positivamente poderia acalmar as suas preocupações. Isto é verdade, mas isoladamente não chega. O melhor remédio para o pensamento distorcido não é o pensamento positivo, mas sim o pensamento preciso.
Ajude a criança a aplicar os 3 passos seguintes:
- Pegar os pensamentos: Imagine que cada pensamento que você tem flutua acima da sua cabeça numa bolha (como o que você vê em quadrinhos). Agora, pegue um dos pensamentos de preocupação, como: “Ninguém na escola gosta de mim.”
- Recolher evidências: Em seguida, colete evidências para apoiar ou negar este pensamento. Ensine a criança a não fazer julgamentos sobre as preocupações com base apenas em sentimentos. Os sentimentos não são fatos. (Evidências de suporte da preocupação: “Eu tive dificuldade em encontrar alguém que quisesse sentar-se comigo no almoço.” Negar a evidência da preocupação: “O António e eu fazemos os trabalhos de casa juntos, ele é meu amigo.“
- Desafiar os pensamentos: A melhor maneira (e mais divertida) de fazer isso é ensinar a criança a ter um debate consigo mesma.
5 – Permita que a criança se preocupe
Como expliquei anteriormente, dizer à criança para não se preocupar não vai impedi-la de fazê-lo. Se as crianças conseguissem simplesmente deixar de se sentirem mal, elas fariam-no. O que melhor funciona é passar a mensagem que não existem nenhum mal em preocuparmo-nos, e que em doses adequadas, pode ser útil.
Crie um ritual diário reservado exclusivamente para abordar os temas acerca dos quais a criança se preocupa ou conduzem à ansiedade. Pode ser um período de 10 a 15 minutos, durante o qual incentiva a criança a sentir-se livre para falar ou escrever sobre as suas preocupações. Você pode tornar a atividade divertida. Por exemplo, decorar uma caixa da preocupação. Durante o tempo de preocupação, não há regras sobre o que constitui uma preocupação válida, vale tudo. Quando o tempo chegar ao fim, a caixa deve ser fechada e dizer adeus às preocupações para esse dia.
6 – Ajude a criança a mudar o discurso de: “E se…” para, “O que posso fazer para…”
Vou revelar-lhe o seguinte, nós seres humanos somos capazes de viajar no tempo. Não fisicamente, mas mentalmente. De fato, mentalmente gastamos muito tempo com a cabeça no futuro. Para uma criança que sofre de ansiedade, este tipo de viagem mental no tempo pode exacerbar a preocupação, levando-a a fazer perguntas do género: “E se eu não conseguir abrir o meu armário e perder a aula?” ou “E se a Inês não falar comigo hoje?” ou “E se eu não passar no teste?“A pesquisa mostra que voltar para o momento presente pode ajudar a aliviar essa tendência.
Um método eficaz de fazer isso é praticar exercícios de conscientização. A Atenção Plena (Mindfulness) traz uma criança do discurso “e se…” para, “o que posso fazer para”. Para praticar isso, ajude o seu filho a concentrar-se na respiração por alguns minutos. Deixo um pequeno exemplo:
Medida de ação: Quando a criança começa a sentir-se ansiosa, explique-lhe que deverá usar essa sensação como uma sugestão para fazer pelo menos uma respiração abdominal profunda. Essa respiração vai iniciar a resposta de relaxamento. Para praticar, ajude a criança a fazer o seguinte exercício:
- Foque a sua atenção no modo como respira. Se conhecer o modo como respira habitualmente, poderá usar a respiração para se relaxar em momentos que se sinta ansioso.
- Concentre-se nas partes do seu corpo (tórax) que usa para respirar. Sinta como os diferentes músculos se movem durante a inspiração e a expiração, sinta isso.
- Esteja tento a todas as sensações que sente quando respira. Memorize essas sensações, para poder reproduzi-las em situação em que se sente ansioso.
- Agora, coloque uma mão em cima do peito e outra sobre o seu estômago.
- Note os movimentos de expansão e de contração do peito, à medida que inspira e expira.
- Note os movimentos de expansão e de contração do estômago, à medida que inspira e expira. Foque-se nessas sensações durante 1 minuto.
- Em seguida sempre que verificar que está a respirar pelo tórax, mude para os músculos do estômago.
- Em seguida foque-se na expiração, liberte o ar por entre os lábios, para controlar a sua saída…verifique se são os músculos do abdómen e do diafragma que se contraem.
- Repita o processo demorando o dobro do tempo para expirar do que a inspirar o ar.
O exercício de focar-se na respiração retira a criança da construção de um cenário catastrófico, dando-lhe a possibilidade de posteriormente focar-se no que pode fazer para solucionar ou minimizar o problema que o perturba. Passando de um discurso de: “E se a Inês não falar comigo hoje?” para “O que posso fazer para me certificar que a Inês fala comigo hoje?“
Se pretender aprofundar o tema da Atenção Plena (Mindfulness), leia o artigo: Use a mindfulness para melhora o seu estado de espírito
7. Não evite tudo que causa ansiedade à criança
A criança quer evitar eventos sociais, os cães, a escola, aviões ou basicamente qualquer situação que causa ansiedade? Como pai, você quer ajudá-la a não sofrer com a ansiedade? Claro! Isso é natural. A resposta de fuga ao que nos provoca incómodo é natural. Infelizmente, a longo prazo, evitar a ansiedade aumenta-a. Então, qual é a alternativa? Tente a exposição progressiva e gradual às coisas temidas.
Vamos dizer que o seu filho tem medo de sentar-se nos baloiços no parque. Em vez de evitar essa atividade, deve criar mini-metas para chegar mais perto do objetivo maior. Por exemplo, vá até ao limite do parque, em seguida, entre no parque, depois aproxime-se da zona dos baloiços, em seguida sente simplesmente a criança no baloiço, comece com pequenas oscilações e finalmente deixe baloiçar-se sozinha.
Toda esta progressão poderá levar alguns dias, fazendo um ou dois avanços por dia. Você pode usar cada etapa até que a exposição se torna muito fácil e deixe de causar desconforto à criança, esse é o momento em que você sabe que é hora de passar para o próximo degrau na escada da exposição.
Importa que você saiba como manter a calma na presença da criança, sobretudo se ela passar por algum momento mais difícil.
Você é o suporte da criança
Dar suporte a uma criança que sofre de ansiedade pode ser doloroso, frustrante e confuso. Não há um pai que não se pergunte em um momento ou outro, se eles são a causa da ansiedade de seus filhos. É importante que você saiba que a pesquisa mostra que a ansiedade é muitas vezes o resultado de múltiplos fatores (ou seja, genes, fisiologia do cérebro, temperamento, fatores ambientais, eventos traumáticos do passado, etc.). Por favor, mantenha em mente, que provavelmente você pode não ser a causa da ansiedade da criança, mas você pode ajudá-la a superá-la.
Se verifica que apesar dos seus esforços a criança continua a sofrer de ansiedade, e esta continua a aumentar, procure ajuda profissional.
Abraço,
Miguel Lucas
Artigo muito esclarecedor! Não tenho mais crianças pequenas e na época dos meus filhos pequenos, tínhamos menos bombardeios de visões e estímulos eletrônicos nas crianças. Hoje, educar está muito preocupante e parece que alguns pais estão desistindo dessa tarefa. Pena! as consequências serão gravíssimas no futuro. Paz e Luz.
Gostei muito desse artigo. Tenho um neto de 4 anos que passou pela fase de não querer ir para a escola. Foi complicado, mas foi o Pai dele quem conseguiu aliviar a situação. Vou passar para minha filha essas informações. Obrigada e Parabéns!!!!!!!!
Muito bom serviu ate p controlar a minha própria ansiedade alguns exemplos
Artigo nota 10. Alinhadissimo com as pesquisas sobre foco e inteligência emocional. Parabéns.
Ajudou muito a refletir sobre vários aspectos….Parabéns!!!
Muito bom seu artigo, muito obrigada!!! Tenho um filho de dez anos e estou observando uma crescente ansiedade nele, vou aplicar essas técnicas. Obrigada!
Adorei!!! minha filha de 7 anos esta passando por isso…medo na hora de dormir e comer..fico arrasada em ver ela assim…adorei essas informações…
obrigada foi muito util
MEU FILHO VOMITOU NA ESCOLA ,MINHA ESPOSA LEVOU AO MÉDICO E ELE DISSE QUE FOI O PSICOLOGICO DELE ,ENTÃO ELA O LEVOU AO PSICOLOGO ELE DISSE QUE FOI NERVOSISMO POR ALGUNHA CITUAÇÃO .EU ESTOU A TRABALHO LONGE DE CASA SÓ VOU EM CASA UMA VEZ POR MÊS SOMOS MUITO PROXIMOS ACREDITO QUE ISSO PODE TER ALGUNHA RELAÇÃO .EU TAMBÉM TENHO PROBLEMAS DE ANCIEDADE FAÇO TRATAMENTO COM REMEDIOS CONTROLADOS.ESSE TEXTO VAI ME AJUDAR A LIDAR COM A CITUAÇÃO OBG.
Tenho uma filha que sofre de ansiedade desde os 7 anos , hoje ela tem 14 e ainda tem crises muito severas , o pensamento fica como um disco riscado e ela não consegue fazer mais nada , entra em total desespero , faz tratamento com psiquiatra e toma um remédio para controlar , mas mesmo assim ainda tem algumas crises , vomita , treme chora desesperadamente e não come nada , os pensamentos são obsessivos , temos que ter muita paciência e tentar acalma-lá embora saibamos que só o tempo vai afastar o pensamento , até que surja outro , é duro ver esses pequenos sofrendo tão cedo , muito amor e confiança são a chave para um pequeno alívio para eles .
MUITO BOM…ME AJUDOU BASTANTE
Tenho um filho de 3 anos é uma criança que não se concentra em quase nada e se ele está fazendo algo como uma simples refeição já se preocupa em que ele vai fazer depois…se começo a ler um livro ele já quer saber o que vai acontecer no final do livro…e o principal que percebi e que desde o primeiro ano de vida mais ou menos eu não corto as unhas das mãos dele ele roe todas….seria os primeiros sinais de ansiedade ??